Mecanismo de toxicidade do arsénio pentavalente:
Em muitas reações bioquímicas, o fosfato pode ser substituído pelo arsenato (AsO43-: o átomo de arsénio tem 5 eletrões de valência, sendo por isso também conhecido como arsénio pentavalente), pois estes dois têm estruturas e propriedades idênticas [8].

Ilustração 4: Estruturas químicas dos aniões fosfato e arsenato [9].
O fosfato pode ser substituído pelo arsenato na bomba de sódio e no transportador de troca de aniões no eritrócito. Desta forma, o arsenato contribui para a diminuição de formação de adenosina trifosfato (ATP) através do mecanismo chamado arsenólise [8].
A arsenólise pode ocorrer durante a glicólise, pois o fosfato, num dos passos da via glicolítica, liga-se enzimaticamente ao gliceraldeído-3-fosfato formando o 1,3-bifosfoglicerato. Se ao gliceraldeído-3-fosfato se ligar o arsenato em vez de fosfato, forma-se o anidrido 1-arseno-3-fosfoglicerato que é instável, pois hidrolisa-se facilmente a arsenato e 3-fosfoglicerato. Assim, só na presença de fosfato é que o ATP é gerado na glicólise, e não na presença de arsenato [8].
Na mitocôndria também pode ocorrer a arsenólise durante a fosforilação oxidativa, ou seja, na presença de arsenato forma-se o complexo ADP-arsenato (ADP – adenosina difosfato), que é muito instável e que se hidrolisa facilmente em comparação com o ADP-fosfato (ATP) [8].
Portanto, devido à substituição do fosfato pelo arsenato, há diminuição da formação do ATP em alguns tecidos celulares, sendo assim o arsenato tóxico [8].
Mecanismo de toxicidade do arsénio trivalente:
O arsénio trivalente (arsenito e MMAIII – monomethylarsonous acid) reage com moléculas que contenham os grupos tiol ou sulfidrilo, como a cisteína e a glutationa, tendo maior afinidade para grupos tiol do que para grupos monotiol [8].
Atendendo ao facto de que os grupos tiol e sulfidrilo são importantes para a atividade de algumas moléculas, como enzimas, coenzimas e recetores, a ligação do arsénio trivalente a esses grupos pode inibir reações bioquímicas importantes, conduzindo à toxicidade [8].
Por exemplo, o piruvato desidrogenase (PDH) necessita de um cofator para a sua atividade enzimática, que é o ácido lipóico (um ditiol). O arsenito inibe o PDH, provavelmente por se ligar ao ácido lipóico. O MMAIII é um inibidor do PDH mais potente que o arsenito. A inibição do PDH pode levar à diminuição da produção de ATP, pois o PDH não vai oxidar o piruvato a acetil-CoA, que é um percursor dos intermediários do ciclo de Krebs, e assim, este ciclo não origina espécies redutoras que serão utilizadas pela cadeia transportadora de eletrões para formar ATP, diminuindo assim a produção de ATP. Alguns intermediários do ciclo de Krebs são necessários para que ocorra a gluconeogénese e, ao inibir o PDH, haverá consequentemente uma diminuição de hidratos de carbono [8].

Ilustração 5: Esquema representativo do Ciclo de Krebs [10].
O arsénio trivalente metilado, como o MMAIII, é um potente inibidor da glutationa redutase e da tioredoxina redutase, devido à sua interação com grupos tiol nestas enzimas. A inibição destas enzimas poderá alterar o estado redox celular e, consequentemente, levar à citotoxicidade [8].
8. Hughes, M.F., Arsenic toxicity and potential mechanisms of action. Toxicology Letters, 2002. 133(1): p. 1-16.
9. Heringer, O. Por que ATP!? 2014 [cited 2015 14-05-2015]; Available from: http://scienceblogs.com.br/synbiobrasil/tag/fosfato/.
10. Spoladore. Ciclo de Krebs. 2007 [cited 2015 14-05-2015]; Available from: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ciclo_de_Krebs.